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Derrota de Trump e ataques ao meio ambiente podem isolar o Brasil sob Bolsonaro, diz professor


Foto: reprodução

Pesquisas eleitorais realizadas nas últimas semanas têm registrado vantagem do candidato democrata à presidência dos Estados Unidos, Joe Biden, entre 8% e 9% sobre o republicano Donald Trump. Porém, no complexo sistema eleitoral do país – em que a decisão se dá não apenas pelo voto direto dos eleitores, mas também pela soma dos delegados dos estados –, estar à frente nas pesquisas não garante a eleição. Trump é um exemplo recente. Em 2016, ele perdeu no voto popular para Hillary Clinton por quase 338 mil votos, mas venceu no Colégio Eleitoral e assumiu a Casa Branca.


Na maioria dos estados norte-americanos, o candidato fica com todos os votos dos delegados de cada estado onde consegue a maioria dos votos. Se Biden vence a eleição na Califórnia, por exemplo, ele leva ao Colégio Eleitoral (composto no total por 538 delegados) todos os 55 votos do estado.


Nesta sexta, veio a público que Trump e a primeira-dama, Melania, estão com a covid-19. Não se sabe, no momento, que repercussão isso pode vir a ter na corrida à Casa Branca. Trump pode capitalizar o fato, como Bolsonaro, com a facada em 2018.


Independentemente do sistema e da “facada” metafórica sofrida pelo presidente, a expectativa de que Biden vença é grande entre parte dos setores progressistas brasileiros. Mas, para Reginaldo Nasser, professor de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), uma mudança de presidente nos EUA, normalmente, não altera essencialmente as relações e nem os negócios entre os países e uma eleição interfere menos no Brasil do que certos setores por aqui desejam.


Além disso, o Congresso norte-americano tem muito peso em política externa. “Muitas vezes há lobbies em que democratas e republicanos se unem. Além disso, Biden faz parte de uma elite americana, é um milionário, apoiou a guerra (votou a favor da autorização da invasão do Iraque em 2002).”


Biden, democrata à direita

Apesar de o democrata ser mais internacionalista, educado, com um perfil semelhante a Clinton, Carter e Obama, Nasser lembra que a tradição democrata não é exatamente o que se pode chamar de pacifista. Nos mandatos de Obama (2009-2017), por exemplo, a Síria foi praticamente destruída a partir de 2011, quando a secretária de Estado era Hillary. “Biden está mais à direita de Bill Clinton e Obama”, diz.


A questão, no quadro atual, é que Trump levou tão ao extremo o negacionismo, o racismo e outros princípios de extrema-direita, que uma mudança com a eleição de Biden vai ter repercussão relativamente positiva, destaca o professor. “Não houve grandes mudanças na passagem de Bush para Obama, mas vai ter mais na mudança de Trump para Biden. Menos por Biden, que é a direita democrata, do que por Trump, na medida em que Trump jogou no extremo.”


Para ele, a mudança mais visível vai ser na área do meio ambiente, o que teria repercussões ao Brasil, cujo presidente é quase um discípulo de Trump. “Tanto que esse tema foi destaque no primeiro debate entre os candidatos à Casa Branca (realizado na terça-feira, 29). Vai haver pressão maior a Bolsonaro, de fora e aqui dentro. Isso certamente vai fragilizar a política de meio ambiente dele. É o tema principal em torno de Bolsonaro no mundo.”


Florestas no Brasil

No debate, o democrata disse que a política ambiental de Trump é conivente com a tragédia ambiental brasileira. “As florestas no Brasil estão desmoronando, e muito mais gás carbônico está sendo lançado lá que nos Estados Unidos”, disse Biden.


As mudanças na questão ambiental não se devem ao fato de que os grandes grupos empresariais preocupados com os incêndios nas florestas brasileiras sejam “bonzinhos”, observa o professor da PUC. A preocupação desses grupos é, por exemplo, com as cadeias globais de produção de mercadorias ou de energia renovável  gravemente afetadas por incêndios e inundações onde têm investimentos.


“Esses investidores vão ganhar força aqui e, quanto ao meio ambiente, Bolsonaro vai ter sérias dificuldades”, prevê. “E na questão política-ideológica, ele vai ficar isolado no mundo cada vez mais.” Mas a disputa entre Trump (que tem a preferência dos grande grupos do setor petrolífero) e Biden é uma briga de elites. A questão do meio ambiente racha essas elites americanas desde Al Gore, em 2000” , observa Nasser.


Trump, mudanças climáticas e os americanos

Uma pesquisa nacional da instituição Pew Research Center em junho mostrou que 60% dos norte-americanos veem as mudanças climáticas como uma grande ameaça ao seu bem-estar. Cerca de dois terços (65%) dos americanos afirmaram que o governo Trump está fazendo muito pouco para reduzir os efeitos do problema.


Segundo a pesquisa, “mais da metade dos republicanos e uma parcela esmagadora de democratas ” afirmam que favoreceriam iniciativas para reduzir os impactos das mudanças climáticas. Mais uma vez, observa Reginaldo Nasser, isso não se dá porque os cidadãos americanos de repente se tornaram “bonzinhos” e conscientes. “Não é propriamente pelo meio ambiente, mas as pessoas estão vendo os lugares onde moram pegar fogo.”

Incêndios devastaram a Costa Oeste dos Estados Unidos nas duas primeiras semanas de setembro, em estados como Califórnia, Oregon e Washington.

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