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Para Joênia Wapichana, “alternativas limpas e renováveis” podem substituir o linhão de Tucuruí


A deputada federal indígena Joênia Wapichana (REDE/RR) disse nesta segunda-feira (25) que o “bom senso” e as “alternativas limpas e renováveis” devem prevalecer para substituir a obra do linhão de Tucuruí (Manaus-Boa Vista). A construção da linha de transmissão de energia passará por dentro do território indígena do povo Waimiri-Atroari. Em recente decisão, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) autorizou a obra sem necessidade de consulta aos indígenas sob a justificativa de tratar-se de interesse da Política de Defesa Nacional.

“Acho que nós temos a possibilidade de ter soluções sustentáveis na Amazônia. A Amazônia não pode ser vista somente do ângulo que só degrada. Nós tivemos uma má experiência esse ano no Brasil com o caso de Brumadinho, que teve uma barragem construída sem atentar para os impactos que poderia causar, nós não queremos que isso volte a ocorrer”, afirma a deputada em entrevista à agência Amazônia Real na noite de abertura do Feira Energia e Comunidades, evento que vai de 25 a 28 de março em Manaus (AM).

Os índios Waimiri-Atroari são contrários as obras, pois alegam que a construção de torres de transmissão trarão impactos socioambientais nas aldeias, onde vivem cerca de 2.000 pessoas.

Para a deputada Joênia os direitos dos direitos dos Waimiri-Atroari devem ser respeitados. “Espero que o governo não passe por cima dos indígenas, senão incorrerá em uma série de procedimentos ilegais”, diz.

Ela lembrou que, desde 2015, os estudos dos impactos ambientais da obra estão em discussão. “Então as coisas estão andando. A Justiça Federal do Amazonas já fez uma análise e já teve uma decisão justamente para que, nesses procedimentos, onde ocorrem medidas administrativas, os indígenas tenham o direito a uma consulta prévia respeitado conforme a Convenção 169, da Organização Internacional do Trabalho (OIT) legislação com a qual o Brasil concordou em respeitar”, disse deputada, referindo-se a medidas adotadas pelo MPF.

Conforme o decreto, o governo Bolsonaro planeja iniciar as obras de transmissão de energia do Linhão de Tucuruí ainda no terceiro trimestre de 2019. A estrutura tem 715 quilômetros de extensão, dos quais aproximadamente 120 atravessam a Terra Indígena Waimiri-Atroari, localizada no norte do Amazonas, divisa com Roraima.

Segundo o Programa Waimiri-Atroari, os Kinja (como se auto denominam os indígenas), ainda não se manifestaram em relação à recente decisão do governo, pois oficialmente não foram comunicados pelo governo e por isso preferem não falar.

Adriana Ramos, do ISA, e a deputada Joênia Wapichana (Foto: Alberto César Araújo/Amazônia Real)

“Esse assunto não é uma surpresa, já vem sendo discutido desde governos anteriores. Os próprios Waimiri-Atroari, salvo engano, apresentaram uma alternativa, que era [o Linhão] passar por fora da terra indígena. E, naquela época, já havia uma discussão de que era possível sim. Agora não se prepararam pra isso, não quiseram respeitar o direito de consulta, a gente tem que obedecer esses procedimentos”, recorda Joênia.

O MPF/AM sinalizou que vai entrar na Justiça contra a medida do governo de Jair Bolsonaro (PSL) que, na prática, autoriza a construção da linha de transmissão de energia que liga Manaus a Boa Vista, rasgando a terra indígena dos Waimiri-Atroari, sem necessidade de consulta aos indígenas.

A construção do Linhão de Tucuruí ou alguma alternativa de fornecimento de energia elétrica para o estado de Roraima é uma medida urgente, pois mais de 50% da energia consumida pelos roraimenses são gerados pela Usina Hidrelétrica de Guri, na Venezuela, e vendida ao Brasil pela estatal Corpoelec. Além disso, Roraima é o único estado Brasil que está ligado ao Sistema Interligado Nacional (SIN). Com o iminente colapso do país vizinho, o estado pode ficar sem energia elétrica a qualquer momento.

“Ninguém está questionando ter energia em Roraima. É necessário sim. A população merece. Nossa energia vem da Venezuela e nós precisamos discutir alternativas. Não somente a questão de barragens ou atropelar os direitos indígenas, mas precisamos realmente ter uma solução para isso que respeite os direitos dos povos indígenas. Os povos indígenas não estão questionando a questão da energia. Se tiver que passar pela terra indígena vai ter que obedecer todos os critérios que a lei determina para que justamente não haja atropelo dos direitos”, avalia Joênia.

A deputada federal disse que, como parlamentar irá fazer com que a discussão sobre as soluções energéticas para a Amazônia sejam compreendidas de acordo com a realidade local. “Lógico que, como estou no Poder Legislativo, vou acompanhar as discussões e me pronunciar pela defesa coletiva dos direitos dos povos indígenas e, no meu entender, no que for possível, fazer a defesa em proposições propositivas eu vou fazer. A minha intervenção vai ser sempre pela defesa coletiva dos povos indígenas. Estou em várias comissões, uma delas é a CCJ, a Comissão de Meio Ambiente, a de Minas e Energia e os Direitos Humanos. E vou usar das minhas prerrogativas como deputada para me pronunciar e defender os direitos dos povos indígenas”.

Soluções energéticas

Energia solar é uma alternativa na Amazônia Foto: Alberto César Araújo/Amazônia Real)

A Feira Energia e Comunidades, que começou nesta segunda-feira (25) e vai até quinta-feira (28), é um evento que propõe a discussão da adoção de energia de baixo impacto em comunidades tradicionais da Amazônia como opção de hidrelétricas, por exemplo.

Segundo a organização, representantes de 160 comunidades tradicionais participam do evento. Elas estão reunidas para discutir problemas incomum que afligem as populações tradicionais acarretadas pela falta ou fornecimento de energia precário nos locais mais distantes dos centros urbanos da região. A busca por essas formas autônomas de geração de energia limpa contribui para fortalecer os projetos de vida dessas comunidades.

Uma das participantes é a jornalista e quilombola Maryellen Crisóstomo de Almeida, da comunidade Baião, localizada no município de Almas, a 300 quilômetros de Palmas, no Tocantins.

A jornalista Maryelle Chrisostomo de Almeida (Foto: Alberto César Araújo/Amazônia Real)

Segundo ela, a falta de energia elétrica provoca problemas que afetam a qualidade de vida da população como em comunidades do Sudeste do estado, que não possuem energia elétrica e sequer água. A situação é agravada pela demora na demarcação das terras e pela contaminação do solo por agrotóxicos usados no plantio de soja. “O nosso objetivo [ao participar do evento] é compartilhar as soluções viáveis que possam ser adotadas nas comunidades de acordo com a realidade de cada uma”, esclarece.

As comunidades indígenas do Xingu, no Pará, possuem diversas necessidades relacionadas à saúde, educação e comunicação, que podem ser sanadas com energia elétrica. Morador do médio Xingu, no município de Feliz Natal, o jovem Siraem Kayabi, participa do evento para apresentar as soluções que estão trazendo melhorias à sua comunidade.

“Na nossa comunidade não temos energia gerada por gerador a combustível, agora conhecemos e estamos usando o sistema fotovoltáico, que melhorou a nossa vida. Supriu necessidades na área de saúde e educação. Agora, estamos buscando meios de melhorar e ampliar conhecimento sobre a iniciativa”, explica.

Comunidade Boa Esperança, na RDS Amanã, o telhado é coberto por painéis solares (Foto: Vandré Fonseca/Amazônia Real).

A coordenadora de políticas e direitos socioambientais do Instituto Socioambiental (ISA), Adriana Ramos, avalia que as condições de produção de energia na Amazônia são contraditórias. O ISA é uma das 12 organizações que estão realizando o evento em Manaus.

“A gente vê que muitas vezes as comunidades têm um modo de vida de baixo impacto, desenvolvem atividades na perspectiva do uso sustentável da floresta, mas a dependência dos combustíveis fósseis vai na contramão dessa construção de sustentabilidade que a gente tem”, avalia Adriana Ramos, referindo-se à necessidade de uso de geradores nas comunidades.

Na opinião de Adriana, isso acontece desde as pequenas comunidades tradicionais até as grandes cidades que dependem de termelétricas.

“Tudo de bom que a Amazônia traz, que a floresta contribui, por exemplo, para a regulação climática, acaba sendo afetado por essas iniciativas de gerar energia usando combustível fóssil. Sendo que temos diversas outras alternativas, que muitas vezes não estão acessíveis”.

Ela completa: “É fundamental que isso passe a ser olhado nesse escopo de projetos que já apoia iniciativas de uso sustentável da floresta, de proteção dos territórios, de monitoramento e também trabalhar a questão da geração de energia para melhorar ainda mais as condições de vida das comunidades da floresta.”

Fonte: Amazônia Real

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