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ONU alerta para retrocessos na eliminação da pena de morte no mundo


Instalações da Penitenciária Eastern State, a primeira dos Estados Unidos. As instalações foram desativas e transformadas em um museu. Foto: Flickr (CC)/Curious Expeditions

Em mensagem para o Dia Mundial contra a Pena de Morte, lembrado nessa quarta-feira (10), o secretário-geral da ONU, António Guterres, alertou que o progresso para pôr fim a esse tipo de condenação tem sido “frustrado por retrocessos”. Desde 2007, cerca de 170 países aboliram ou suspenderam execuções, mas nos Estados onde a prática ainda é vigente, sentenças são definidas em processos sem transparência e incompatíveis com padrões internacionais de direitos humanos.

“Em alguns países, pessoas são condenadas à morte em julgamentos secretos, sem o devido processo (legal), o que aumenta o potencial de erro ou de abusos”, alertou o chefe das Nações Unidas.

Guterres disse estar “profundamente perturbado” pelo fato de que vários menores infratores foram sentenciados à morte em 2018. Na semana passada, a iraniana Zeinab Lokran foi executada por ter matado seu marido quando tinha 17 anos. O veredito foi determinado em um julgamento marcado por irregularidades. A jovem reivindicava ter sido forçada a confessar o assassinato, além de dizer ser vítima de violência doméstica — as alegações da ré não foram examinadas adequadamente, de acordo com o Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH).

“Outras centenas de pessoas foram executadas sem terem podido receber assistência legal durante procedimentos criminais — que poderiam tê-los salvado da pena de morte — porque eram pobres, mulheres ou de outras minorias”, acrescentou o secretário-geral.

Guterres concluiu seu pronunciamento com um pedido pelo fim imediato da pena de morte. Até o final de 2017, 106 nações já haviam abolido completamente a prática. Em novembro de 2017, o ACNUDH estimava que a maioria das execuções ocorria na China, Paquistão, Iraque, Irã e Arábia Saudita.

Há 11 anos, a Assembleia Geral da ONU aprovou uma resolução que pedia a restrição progressiva do uso da pena capital. O texto também determinava que países diminuíssem o número de infrações e crimes passíveis de punição com a pena de morte. A medida solicitava ainda que os Estados-membros fornecessem informações ao secretário-geral sobre a aplicação dessa sentença em seus territórios.

Mulheres condenadas: uma população invisível

Também por ocasião do dia mundial, um grupo de especialistas de direitos humanos da ONU alertou que mulheres e meninas constituem uma “população invisível no corredor da morte”. Embora os homens sejam maioria entre os sentenciados com a pena capital, as rés do sexo feminino têm suas necessidades específicas “escondidas”, junto com os problemas que as levam a ser condenadas, como a discriminação de gênero.

Atualmente, existem pelo menos 500 mulheres condenadas à morte no mundo. Isso representa menos de 5% de todos os indivíduos sentenciados com a pena capital, mas a proporção esconde variações importantes entre os países. Em algumas nações, o índice chega a 18%.

“Estamos extremamente preocupados com o fato de que uma proporção significativa das mulheres no corredor da morte tenham sido afetadas por violência de gênero, abuso e trauma. Em particular no caso das meninas sentenciadas à morte, a maioria dos casos conhecidos diz respeito a rés que mataram uma figura de autoridade em contextos de casamento infantil e/ou violência baseada em gênero”, afirmaram os relatores.

Na avaliação dos especialistas, os tribunais “falham rotineiramente” em considerar o histórico das acusadas, que são muitas vezes sobreviventes de violência e opressão de gênero. Segundo os analistas, é “extremamente raro” a Justiça considerar abusos domésticos como um fator em julgamentos envolvendo condenação à morte.

Os relatores lembraram que a aplicação da pena de morte para menores de 18 anos é estritamente proibida pelo direito internacional. Padrões universais para o devido processo legal também preveem que a imposição da pena capital é sempre arbitrária e ilegal quando a corte desconsidera fatos essenciais, capazes de ter influenciado as motivações e a conduta dos réus. Entre esses elementos, está a exposição das mulheres à violência doméstica e outras agressões.

“Em muitos casos, os tribunais julgam mulheres não apenas por seus supostos crimes, mas também pelo que é percebido como falhas morais: esposas ‘desleais’, mães ‘descuidadas’ ou filhas ‘ingratas’. Em nenhuma outra situação, transgressões de normas sociais e culturais sobre comportamento de gênero são punidas mais severamente do que num julgamento capital”, acrescenta a declaração.

Os relatores também ressaltaram que “as mulheres são criminalizadas por crimes de drogas a uma taxa extraordinária, representando cerca de 30% das prisões em todo o mundo por tráfico”.

“A maioria das mulheres no corredor da morte por crimes de drogas são pobres e estrangeiras ou migrantes. A maioria parece ser (ré por trabalhar como) ‘mulas’ ou vendedoras de rua. O uso desproporcional da pena de morte contra elas reflete políticas criminais excessivamente duras e discursos públicos violentos no contexto da chamada ‘guerra às drogas’, que envolve violações de direitos humanos severas e generalizadas.”

Os especialistas cobraram a revisão de todas as penas de morte imputadas a mulheres e meninas, além de solicitar políticas e respostas para combater o viés, a violência e a discriminação de gênero — problemas que afetam as investigações e os julgamentos.

O pronunciamento também pede respeito às Regras das Nações Unidas para o

Tratamento de Mulheres Presas e Medidas não privativas de liberdade para Mulheres Infratoras — as diretrizes também são conhecidas como as Regras de Bangkok.

O comunicado dos relatores foi assinado pela relatora especial sobre execuções sumárias, extrajudiciais ou arbitrárias, Agnes Callamard; pelo relator especial sobre liberdade religiosa ou de crença, Ahmed Shaheed; pelo relator especial sobre o direito à saúde física e mental, Dainius Pūras; pelo relator especial sobre a independência de juízes e advogados, Diego García-Sayán; pela relatora especial sobre violência contra as mulheres, Dubravka Šimonović; pelo relator especial sobre os direitos humanos de migrantes, Felipe González; pela presidenta do Grupo de Trabalho sobre a Questão da

Discriminação contra as Mulheres na Lei e na Prática, Ivana Radačić; pela relatora especial no campo dos direitos culturais, Karima Bennoune; pelo relator especial sobre tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanas ou degradantes, Nils Melzer; pelo relator especial sobre extrema pobreza, Philip Alston; e pelo relator e presidente do Grupo de Trabalho sobre Detenção Arbitrária, Seong-Phil Hong.

Fonte: Agência Brasil

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