“65 anos para homens, 62 para mulheres. Professor até 60. Tempo de contribuição para trabalhador rural. Transição de 12 anos, pior que Temer. Afeta o setor público. Aposentadoria por invalidez restrita. Pensão por morte abaixo do salário mínimo. Bem-vindo à reforma da Previdência de Bolsonaro”. Esse foi o resumo feito pelo líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), após a chegada da Proposta de Emenda Constitucional (PEC 6/2019) – reforma da Previdência – nesta quarta-feira (20) no Congresso Nacional.
A proposta levada por Jair Bolsonaro para a Câmara dos Deputados aumenta o tempo de contribuição para os brasileiros e blinda, ao menos num primeiro momento, os militares. “Se o projeto já é imprestável, imagine só se não alcança esse segmento, onde existe uma verdadeira caixa-preta no regime? Inaceitável”, criticou Humberto.
Além disso, com o aventado regime de capitalização, o governo sinaliza um favorecimento aos bancos e instituições financeiras privadas, em detrimento do sistema atual de Previdência Social.
Como era esperado, a proposta do governo Bolsonaro diminuiu o período de transição entre as regras atuais e as novas para apenas 12 anos. O projeto apresentado por Michel Temer previa um período de transição de 20 anos.
O governo propôs ainda uma idade mínima de aposentadoria de 65 anos para homens e de 62 para mulheres, a ser aplicada após os 12 anos de transição. Para ter acesso ao benefício da aposentadoria, o trabalhador terá de contribuir por, ao menos, 20 anos. Pela regra atual, esse tempo mínimo de contribuição é de 15 anos. Durante o período de transição, proposto em 12 anos, será cobrado o tempo de contribuição de 35 anos para homens e de 30 anos para as mulheres.
Na avaliação do senador Paulo Paim (PT-RS), que presidiu a CPI da Previdência, em 2017, se faz necessário o aprofundamento do debate acerca da proposta para que se construa um projeto que não prejudique o cidadão.
“A responsabilidade na discussão de um tema como esse é muito grande. Essa proposta é ainda mais danosa para a população do que a apresentada durante o governo Temer. Acredito que podemos aprofundar o debate e fazer com que haja uma composição entre idade e tempo de contribuição”, disse.
Paim já aprovou requerimentos para realização de duas audiências públicas para discutir a proposta. Uma na Comissão de Direitos Humanos (CDH) e outra na Comissão de Assuntos Sociais (CAS). “Uma reforma com essa envergadura não pode ser votada de afogadilho, sem que as pessoas saibam o que vai acontecer”, avaliou.
Em plenário, o senador Rogério Carvalho (PT-SE) criticou o governo que, ao invés de reduzir privilégios, promove o corte de benefícios às camadas mais carentes da sociedade. Na proposta apresentada por Bolsonaro, idosos sem meios de se sustentar terão de aguardar até os 70 anos para receber integralmente o Benefício de Prestação Continuada (BPC). Atualmente, o benefício, no valor de um salário mínimo, é pago mensalmente à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 anos ou mais que comprove não possuir meios de se sustentar, e nem de ter auxílio da família.
“Hoje vimos o governo apresentar uma proposta que desvincula o BPC [do salário mínimo] para os mais pobres. Isso significa levar ao enfraquecimento milhares de municípios brasileiros, ao sofrimento, à morte dos cidadãos mais pobres. O governo que dizia que atacaria os privilégios, ataca o direito à dignidade. Dignidade não é privilégio. Dignidade é um direito que a sociedade inscreveu na Constituição Federal”, disse o senador.
O deputado federal José Guimarães (PT-CE) considerou a reforma injusta e cruel por não acabar com privilégios e nem cobrar as dívidas bilionárias dos devedores da Previdência, ao mesmo tempo em que retira direitos da população mais pobre do País.
“[A reforma] não trata da questão do teto salarial, que é uma questão central para a Previdência, não ataca os sonegadores, aqueles que costumeiramente devem e não contribuem para a Previdência. Não há uma linha na proposta para cobrar a dívida dos devedores, os bancos e as empresas estatais, que devem mais de R$ 456 bilhões à Previdência Social”, atacou.
Durante o 3º Encontro dos Governadores do Brasil, em Brasília, o governador do Piauí, Wellington Dias pediu ao governo federal para retirar da proposta os benefícios que fazem parte de uma rede de proteção social, como é o caso do Benefício de Prestação Continuada (BPC), das pessoas com deficiência ou daqueles que nunca tiveram renda.
“Quando se coloca um aumento da idade para 60 anos e redução no valor do benefício para um grupo que já é necessitado socialmente, isso é muito explosivo. Na verdade, é colocar nas costas dos mais pobres o peso do sacrifício, de forma acima de outro setor que tem salário. É uma coisa que pode estragar as negociações. Por isso, comecei pedindo para retirar isso da reforma”, explicou.
O governador destacou que a retirada desses tópicos abre caminhos para que as outras propostas sejam discutidas.
Paulo Paim - ✔@paulopaim - Fiquei muito preocupado com a reforma do governo. Os prejudicados serão os mais pobres, trabalhadores do campo e da cidade, além das mulheres e idosos.
Confira os principais pontos da proposta apresentada por Bolsonaro:
Idosos muito pobres terão de esperar até 70 anos
A reforma de Jair vai fazer o benefício de idosos de baixa renda, de até 70 anos, ficar abaixo de um salário mínimo. Bolsonaro vai propor mudanças no Benefício de Prestação Continuada (BPC/Loas), pago a pessoas com deficiência e idosos a partir de 65 anos e de baixa renda. O projeto propõe o pagamento de R$ 500 para pessoas com 55 anos. Aos 65 anos, o idoso ou deficiente passaria a receber R$ 750. Somente brasileiros com 70 anos ou mais receberiam o valor integral de um salário mínimo – R$998.
Militares ficaram fora da reforma Jair e seu ministro Paulo Guedes estão com pressa para retirar os direitos dos trabalhadores brasileiros. Mas só dos trabalhadores mesmo, já que na proposta entregue nesta terça (20), Bolsonaro não incluiu os ajustes relacionados à aposentadoria de militares. O Secretário Especial da Previdência, Rogério Marinho, confirmou que os militares ficaram de fora e disse que o desgoverno vai encaminhar uma proposta a parte no fim de março. Será?
Reforma dificulta aposentadoria rural A reforma de Jair também dificulta a aposentadoria de trabalhadores rurais. Isso porque ao transferir dos sindicatos para as prefeituras a comprovação do tempo trabalhado no campo, Bolsonaro facilita situações de corrupção e ‘cabresto eleitoral’. Antes, a Declaração de Atividade Rural era emitida por sindicatos, mas com a MP 871 a aposentadoria deverá ser homologada por uma Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater), credenciada no Plano Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural.
Quem está aposentado corre risco Caso o regime de capitalização pretendido por Guedes seja realmente aprovado, quem já está aposentado também corre riscos. Isso porque nesse regime, em que cada trabalhador é responsável por poupar para sua aposentadoria, pode ocorrer a total falta de recursos do INSS. “A capitalização não determina esse tipo de contribuição e vai desidratar a Previdência pública. Isso ameaça, sim, quem já está aposentado”, afirma a economista Patricia Pelatieri, do Dieese, à Rede Brasil Atual. O Regime Geral da Previdência (RGPS) foi responsável por 93,5% dos benefícios concedidos em 2017. Desse total, 68,4% correspondem a aposentadorias do INSS.
‘Pedágio’ de quem está quase aposentando Jair também quer cobrar um ‘pedágio’ de quem está quase aposentando. A reforma prevê uma regra de transição para quem está a dois anos de cumprir o tempo de contribuição mínimo para aposentadorias – 30 anos, se mulher, e 35 anos, se homem. Essas pessoas poderão optar pela aposentadoria sem a exigência de idade mínima, como é atualmente, mas terão que um “pedágio” de 50% sobre o tempo que falta para se aposentar.
Trabalhar mais tempo para ter aposentadoria integral O tempo de contribuição mínima já saltou de 15 para 20 anos. E isso para o trabalhador receber 60% do benefício. Caso o contribuinte queira se aposentar com o valor integral – o teto hoje é de R$ 5.839 -, o que é um direito dos brasileiros, ele terá que trabalhar por 40 anos. Se o trabalhador contribuir pelos atuais 35 anos, da regra que está em vigor, ele terá direito somente a 90% do benefício.
Reforma de Bolsonaro prejudica professores Bolsonaro propôs uma idade mínima de 60 anos para professores poderem se aposentar. Além disso, essa categoria terá que ainda contribuir por 30 anos. Atualmente, não há uma idade mínima para a aposentadoria de professores, bastando o tempo de contribuição de 30 anos para homens e 25 para mulheres. Agora, Jair que unificar a contagem para 30 anos, prejudicando as professoras do Brasil.
Trabalhadores informais não vão se aposentar Se por um lado Bolsonaro incentiva a informalidade, e até pensa em uma carteira de trabalho verde e amarela, por outro ele não está preocupado com os trabalhadores informais. A proposta de reforma não altera a situação de trabalhadores informais, portanto, um brasileiro que não contribuir ao INSS, não terá direito à aposentadoria. Dados do IBGE mostram 34,3 milhões de trabalhadores estão fora do mercado de trabalho formal e o número pode aumentar com a carteira verde e amarela.
Capitalização só traz vantagens aos bancos Pelo modelo de capitalização proposta por Bolsonaro, as contribuições de cada trabalhador ou trabalhadora serão aplicadas no sistema financeiro, para render juros e correção. Método que já é feito com planos de previdência complementares, administrados por bancos. Se a proposta de Jair foi aprovada, os bancos passarão a cuidar da aposentadoria dos trabalhadores, que será alvo da especulação financeira. Segundo dados recentes da Subsecretaria do Regime de Previdência Complementar, 55% do dinheiro são destinados à renda fixa, tipo de investimento que tem nos títulos da dívida pública sua principal fonte de rendimentos. Isso significa aplicar em papéis desvinculados de atividades que geram trabalho e renda e que só beneficiam os bancos.
Aposentadoria por tempo de contribuição fica inalcançável Atualmente o trabalhador brasileiro pode se aposentar por meio de um a contribuição mista, em que se soma o tempo de trabalho e idade. Se para conseguir o benefício os homens hoje têm que contabilizar 96 pontos e as mulheres 86 pontos, da soma da idade com o tempo de contribuição, esse valor vai saltar para 105 pontos (trabalhador) e 100 pontos para as trabalhadoras. Com a proposta de Jair, fica praticamente impossível alcançar o benefício pela contribuição mista.
Fonte: PT na Câmara/Foto (Crédito:Roberto Parizotti/CUT)