Pelo segundo ano consecutivo, o índice divulgado pelo IBGE recua. Desta vez, ao nível de atividade mais baixo da série histórica, iniciada em 2003. Resultado está 13,2% abaixo do nível recorde, alcançado em maio de 2011. PT propõe uma nova política industrial para o momento pós-pandemia
A completa ausência de política industrial no desgoverno Bolsonaro causou o pior resultado anual para o setor desde 2016, quando a indústria recuou 6,4% enquanto os derrotados nas eleições de 2014 lançavam o Brasil no abismo, afastando a presidenta Dilma Rousseff. A Pesquisa Industrial Mensal – Produção Física (PIM-PF) divulgada na terça (2) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontou um encolhimento de 4,5% da indústria em 2020.
Neste segundo ano de recuo da indústria nacional – em 2019, ela havia caído 1,1% – o nível de atividade chegou ao ponto mais baixo da série histórica, iniciada em 2003. Mesmo após o oitavo resultado mensal positivo seguido, a indústria ainda se encontra 13,2% abaixo do nível recorde, alcançado em maio de 2011.
Em abril do ano passado, enquanto o bolsonarismo promovia ataques à democracia, o setor atingiu o ponto mais baixo de toda a série histórica, operando quase 39% abaixo do pico de maio de 2011.
O setor registrou resultados negativos nas quatro grandes categorias econômicas analisadas: bens de consumo durável (-19,8%); bens de capital (-9,8%); bens de consumo semi e não duráveis (-5,9%); bens intermediários (-1,1%).
A queda foi observada em 20 dos 26 ramos, 53 dos 79 grupos e 60,6% dos 805 produtos pesquisados. Entre as atividades, a de veículos automotores, reboques e carrocerias teve a influência negativa mais intensa: recuou 28,1% em relação a 2019.
“Há uma melhora da produção industrial, mas ainda há muito espaço para ela crescer e não é em função das perdas provocadas pela pandemia. É algo que vem de anos. Tanto que é o segundo ano de queda”, enfatizou o gerente da pesquisa, André Macedo.
Na passagem de novembro para dezembro, a produção de alimentos apresentou a principal influência negativa, com queda de 4,4%. Foi o terceiro mês seguido de recuo na indústria alimentícia – havia recuado 3% em novembro e 4% em outubro.
“O que se observa nesse período é um movimento de perda para a indústria de alimentos. Isso afeta a parte de bens intermediários, que tem um peso relativamente importante no setor como um todo, o que acaba afetando o resultado para a indústria em geral”, analisou Macedo, apontando fatores conjunturais para o recuo.
“Esse movimento de queda é oposto ao que observamos nos dois meses de maior impacto das medidas de isolamento social. Esse resultado pode ter relação com o aumento de preços, pode ter influência da redução do auxílio emergencial, além de uma série de outras influências”, disse o pesquisador.
Macedo ponderou que o fim do auxílio emergencial pode aumentar o impacto negativo sobre a indústria, dado o elevado número de pessoas que, sem ocupação, não têm renda para aquecer o consumo. “A ausência do auxílio emergencial, na medida em que alcançou boa parcela da população, é algo que preocupa e vai definir muito dos rumos não só da indústria, como da economia em geral”, afirmou.
Questionado sobre o que é necessário para a indústria reagir em 2021, o gerente da pesquisa do IBGE foi enfático: “O mercado de trabalho vai ser determinante para sustentar a indústria e a economia como um todo”.
Fábrica fecha as portas em Diadema
No mesmo dia em que o IBGE apontava a queda na produção industrial, os funcionários da Nakata Automotiva, em Diadema (ABC paulista), paralisavam a fábrica e iniciavam uma série de mobilizações em defesa dos empregos. A direção da empresa anunciou o fechamento da unidade e a transferência para o município de Extrema (MG) até o final de março. A Nakata emprega 225 trabalhadores.
“Em nenhum momento se abriu a possibilidade de negociar. O sentimento é que estamos sendo traídos há quatro anos. Eles dão parabéns pela produtividade, falam que todos são uma família, mas estavam preparando a saída”, criticou o secretário-geral do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Moisés Selerges.
O dirigente sindical alerta que é preciso uma discussão mais profunda sobre o que ocorre no Brasil. “É a política lá em Brasília, ou a falta dela, que decide o futuro aqui. Fábrica está parecendo barraca de feira, cada dia está num lugar e o governo só quer plantar soja, milho, derrubar árvore e matar índio. Temos que discutir isso”, finalizou.
O fechamento de unidades fabris pertencentes a grandes multinacionais da indústria se intensificou nos últimos meses. A falta de perspectiva de uma recuperação consistente da economia nacional está na origem da perda de confiança no país. O Índice de Confiança do Empresário Industrial (ICEI) caiu em 26 dos 30 setores da indústria pesquisados em janeiro deste ano, na comparação com dezembro, segundo levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
Outra pesquisa, a que levanta o Índice de Gerentes de Compras (PMI, na sigla em inglês), aponta que a indústria brasileira iniciou 2021 já perdendo força, afetada pelo menor crescimento de novas encomendas e produção desde meados do ano passado. O IHS Markit informou que seu índice PMI caiu a 56,5 em janeiro, de 61,5 em dezembro. Embora tenha permanecido acima da marca de 50, que separa crescimento de contração, a leitura foi a mais baixa desde junho do ano passado.
“Embora a notícia de que o setor industrial brasileiro tenha continuado a expansão em janeiro seja bem-vinda, o fato de que o crescimento mais uma vez perdeu impulso preocupa. O principal sinal de alerta é uma notável redução do crescimento do índice de novos pedidos, um indicador crucial do futuro das contratações e da produção”, alertou a diretora associada de Economia da IHS Markit, Pollyanna De Lima.
Os custos dos insumos para a indústria brasileira aumentaram em janeiro, em meio a relatos de escassez mundial de matéria-prima. Diante do aumento das despesas, as empresas voltaram a aumentar os preços de bens finais em janeiro. Também optaram por limitar as contratações em janeiro. Com isso, o aumento no índice de emprego foi o mais fraco na atual sequência de sete meses de criação de vagas, segundo o PMI.
PT propõe nova indústria para superar pandemia
No “ Plano de Reconstrução e Transformação do Brasil” lançado em setembro do ano passado, o Partido dos Trabalhadores propõe uma nova política industrial após os anos de desmantelamento do sistema produtivo nacional a partir de políticas austericidas adotadas pelas gestões pós- golpe.
Coordenado pelo economista Aloizio Mercadante, presidente da Fundação Perseu Abramo e ex-ministro da Casa Civil no governo Dilma, o plano é fruto de um debate interno entre os setoriais e núcleos de acompanhamento de políticas públicas do PT, além das bancadas federais na Câmara e no Senado.
No documento de apresentação ao programa, o partido lembra que, dos Estados Unidos à China, passando pela União Europeia, os programas de saída da crise decorrente da pandemia do coronavírus têm se focado no avanço da nova indústria e na expansão de infraestruturas modernas.
“A retomada do desenvolvimento deve almejar o aumento da densidade tecnológica e da complexidade da matriz industrial existente, simultaneamente ao seu avanço em direção ao novo paradigma digital, não apenas como consumidores, mas garantindo uma inserção autônoma e soberana do Brasil”, recomenda o documento.
O partido também ressalta que a indústria nascente no momento tem mais complexidade, automação inteligente, relações em redes, digitalização abrangente, baixo carbono e novos processos, com menos trabalho repetitivo e menos poluição.
“O desenvolvimento da estrutura industrial existente é possível por meio de avanços na digitalização empresarial, pela reabilitação e acúmulo de competências fabris e pela utilização competitiva de recursos naturais estratégicos”, ressalta o documento. O partido também aponta para o desmonte, nos últimos anos, dos instrumentos de política pública e de governança da política industrial.
“A Petrobras, o BNDES, a Embraer, a Embrapa, o Finep, além dos sistemas de metrologia, patentes e padronizações estão sendo desmontados. O sistema produtivo estatal e o sistema de bancos públicos abandonaram qualquer preocupação com as políticas de conteúdo nacional e os mecanismos de indução das compras públicas”, prossegue o texto, lembrando que a reconstrução das capacidades estatais é indispensável para o reposicionamento de uma nova indústria digital.
Fonte: Agência PT
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