Da Rede Brasil Atual - O ‘Future-se’, programa do governo Bolsonaro que pretende atrair recursos financeiros para as universidades públicas e institutos federais, fere o princípio da autonomia universitária previsto na Constituição. É o que defenderam representantes da educação ao criticar o programa, em audiência pública na Comissão de Educação (CE) do Senado, nessa segunda-feira (4).
O conselheiro da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Carlos Alexandre Netto, afirmou que o ‘Future-se‘ está inserido “no momento em que as universidades não têm recursos para fechar o ano”, apesar da possibilidade de recursos adicionais, tendo em vista o congelamento de verbas a partir de emenda constitucional de 2017, o que provocou perdas presentes e futuras.
“A universidade pública brasileira é a instituição que mais faz pesquisa nesse país. 60% de toda a ciência que se produz no Brasil advém de 15 universidades. A colaboração com as empresas não representa novidade para as universidades. As ações do ‘Future-se’ já são parte daquilo que elas fazem. O programa tem leitura muito aquém daquilo que nós já fazemos, foi elaborado sem a participação das universidades. Precisamos de uma instância de diálogo”, ressaltou o representante da SBPC.
Segunda secretária do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes), Jacqueline Rodrigues de Lima disse que não há dialogo possível com uma proposta de “privatização” de universidades públicas e institutos federais.
A proposta do programa vem com um conjunto de estratégias que ocorrem não só no Brasil, mas na América Latina, com interesse de submeter os países a um processo educacional único, sem valorizar as especificidades regionais, afirmou.
“É a mercantilização da educação, a ampliação da educação privada com recursos estatais, a educação como um serviço, não como um direito. O principal problema do ‘Future-se’ está na autonomia universitária”, afirmou.
Conselheiro titular da Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação (Fineduca), Nelson Cardoso Amaral disse que a exigência de contrato de desempenho contraria o artigo 207 da Constituição, que dispõe sobre a autonomia universitária.
Amaral ressaltou que a luta pela autonomia não impede que as universidades participem de processo de captação de fontes adicionais, a partir de diversos fundos já existentes. Ele destacou ainda que a proposta de desvinculação do dinheiro da educação, em discussão no governo, representa o fim do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), sobretudo no que se refere à educação básica.
Coordenador-geral da Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnico-Administrativos em Instituições de Ensino Superior Públicas do Brasil (Fasubra), Antônio Alves Neto apontou a falta de debate em torno de um modelo de universidade. “Além do governo não dialogar com a comunidade, busca criar a lógica de que universidade é espaço de balbúrdia para implantar a lógica empresarial. Há contingenciamento de verbas públicas de pesquisa e educação superior para depois se apresentar um projeto salvador para a busca de recursos na iniciativa privada. A lógica do programa é a captação de recursos”, afirmou.
Proponente da audiência pública, o senador Jean Paul Prates (PT-RN) disse que a preocupação tem sido com “o foco do programa parecer ser eminentemente financeiro, com a intenção de incluir gradualmente a cobrança ou a extinção da educação pública de qualidade e a acessibilidade que temos hoje nas universidades federais e estaduais”.
“O que aparenta ser uma coisa pragmática, rápida de resolver os problemas, não é tanto assim, porque começa a incutir conceitos de educação como serviço, que parecem não ser bons para o Brasil nem para outros países”, alertou.