O Senado concluiu na última quarta-feira (23) a análise da Proposta de Emenda Constitucional (PERC 6/2019) que dificulta o acesso aos benefícios previdenciários para milhões de trabalhadores e também para os jovens que ainda não ingressaram no mercado de trabalho.
As novas regras passam a valer a partir da data de promulgação do texto como emenda constitucional. Em alguns casos, como o cálculo dos benefícios previdenciários, sequer há regra de transição. De um dia para o outro, os brasileiros estarão sujeitos a regras mais duras para obtenção da aposentadoria.
“A proposta original do governo destruía o conceito de Previdência pública. A Câmara não deixou isso acontecer. Mas o texto final que foi aprovado ainda é muito duro com o trabalhador”, resume o advogado Marcos Rogério.
Na avaliação do senador Paulo Paim (PT-RS), os partidos de oposição ao governo Bolsonaro tiveram um papel fundamental na redução de danos na comparação entre o texto inicial enviado pelo Poder Executivo ao Congresso Nacional e o resultado que vai fazer parte do texto constitucional.
“Com os destaques conseguimos salvar milhões de pessoas. Com o abono salarial, aposentadoria por periculosidade, trabalhadores rurais, não deixando avançar o regime de capitalização, nós salvamos milhões de pessoas. Mas outros milhões serão atingidos”, resumiu o senador em referência aos pontos alterados do projeto.
Dentre as conquistas obtidas pela Oposição estão a manutenção das regras relativas à aposentadoria dos trabalhadores rurais, do pagamento do Benefício de Prestação Continuada (BPC) aos idosos carentes e pessoas com deficiência e a retirada, por completo, do regime de capitalização.
O regime de capitalização idealizado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, é tido como um dos principais motivos do empobrecimento dos idosos no Chile e da revolta da população contra o atual governo, Sebastian Piñera.
“A explosão do Chile, assim como foi na Grécia, é porque as pessoas não vão aceitar com naturalidade viver na miséria. O Brasil voltou a ser a segunda maior concentração de renda do mundo. Tem algo errado. Todos que defendemos um Brasil de inclusão social fomos dormir mais tristes, desolados com o resultado da votação. Mas não vamos jogar a toalha, vamos continuar batalhando”, disse o senador Jaques Wagner (PT-BA), em referência à chamada PEC Paralela (PEC 133/2019), que também trata de aspectos previdenciários.
Abaixo, pontos alterados pela reforma:
Idade mínima e fim da aposentadoria por tempo de contribuição – Nas regras aprovadas, ao final do tempo de transição deixa de existir a aposentadoria por tempo de contribuição, independentemente da idade do trabalhador. A idade mínima de aposentadoria será de 62 anos para mulheres e de 65 para homens tanto para a iniciativa privada quanto para servidores.
Na nova regra do Regime Geral, o tempo mínimo de contribuição será de 15 anos para mulheres e 20 anos para homens. Para quem já está no mercado de trabalho, porém, o tempo mínimo de contribuição será de 15 anos para homens e de 15 anos para mulheres.
“O governo pretendia, no texto original, a ampliação para 20 anos do tempo de contribuição para homens e mulheres para obtenção da aposentadoria. Isso representaria a expulsão de aproximadamente 60% daqueles que, hoje, se aposentam por idade”, aponta Marcos Rogério.
Para os servidores, o tempo de contribuição mínimo será de 25 anos, com 10 de serviço público e 5 no cargo em que for concedida a aposentadoria.
Trabalhador perde com novo cálculo do benefício – Pelas novas regras, o valor da aposentadoria será calculado com base na média de todo o histórico de contribuições do trabalhador. Atualmente, são descartadas 20% das menores contribuições.
Com o tempo mínimo de contribuição, exigido pela nova regra, (20 anos homem, 15 anos mulher) os trabalhadores do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) terão direito a 60% do valor do benefício e dois 2 pontos percentuais para cada ano a mais de contribuição. Para ter direito a 100% da média dos salários, a mulher terá que contribuir por 35 anos e o homem, por 40 anos.
Confira exemplos no vídeo abaixo:
O valor das aposentadorias e das pensões cairão assim que a PEC 6 for promulgada. Nesse caso, não existe nenhuma regra de transição.
“Se tivéssemos de pensar uma reforma da Previdência, ela teria de equacionar o problema de quase 40% da população brasileira que nunca vai se aposentar. E isso passa longe dessa reforma [aprovada]. Ela não foi feita para resolver os problemas da Previdência. Ela foi feita para cortar direitos”, disse Flávio Tonelli Vaz, assessor técnico da Câmara dos Deputados.
Aposentadoria por incapacidade – O benefício concedido ao trabalhador em decorrência de invalidez atualmente é de 100% da média dos salários de contribuição. Com a reforma, esse benefício passa a ser de 60%, mais 2% por ano de contribuição que ultrapassar os 20 anos.
Em caso de invalidez decorrente de acidente de trabalho, doenças profissionais ou do trabalho, o cálculo do benefício não muda.
Pensão por morte – O valor da pensão por morte também fica menor com as novas regras. Tanto para trabalhadores do setor privado quanto para o serviço público, o benefício familiar será de 50% do valor mais 10% por dependente, até o limite de 100% para cinco ou mais dependentes. Emenda aprovada no Senado garantiu que o benefício, jamais, poderá ser inferior ao salário mínimo.
Fim da aposentadoria especial dos professores – Pelo texto, as professoras da educação básica (educação infantil, ensino fundamental e ensino médio) poderão se aposentar com 57 anos de idade e 25 anos de contribuição; os professores, com 60 de idade e 25 anos de contribuição. Para os servidores da rede pública, as regras são as mesmas, com a exigência de ao menos 10 anos de serviço público e 5 no cargo.
Já nas regras de transição, a categoria terá um bônus de 5 pontos no cálculo da soma do tempo de contribuição com a idade e uma redução de 5 anos na idade mínima e no tempo mínimo de contribuição.
Na prática, alerta Marcos Rogério, a aposentadoria dos professores deixa de existir em decorrência da vinculação da idade com o tempo de atividade. “Para alcançar a integralidade, o professor precisará trabalhar por 40 anos e a professora por 35 anos. Não basta ter a idade mínima. Na prática, os professores perderam a aposentadoria especial”, explicou.
Aposentadoria especial dos expostos a agentes nocivos – Grande vitória do PT no Senado na votação em segundo turno, a PEC permite a aposentadoria especial para trabalhadores expostos a agentes nocivos considerando o tempo de exposição a tais agentes.
Apesar disso, o advogado Marcos Rogério aponta para a necessidade de revisão da vinculação entre idade e tempo de serviço para os casos de aposentadoria especial, sob o risco de as novas regras inviabilizarem a concessão de tal benefício.
“A aposentadoria especial por insalubridade de pessoas expostas a atividades nocivas à saúde permanece. Mas na prática ela deixa de existir pela vinculação da atividade com a idade mínima do trabalhador. “Quando existe a vinculação da idade mínima com o tempo de exposição ocorre, na prática, a retirada do direito à aposentadoria”, explica.
Senado inclui contribuição diferenciada aos trabalhadores informais – Ignorados pelo governo na proposta inicial, os trabalhadores informais serão enquadrados como trabalhadores de baixa renda e terão uma alíquota menor de contribuição para acessar os benefícios da Previdência, semelhante ao modelo de contribuição dos microempreendedores individuais (MEIs).
Regras de transição – A proposta traz uma série de possibilidade de regras de transição para trabalhadores da iniciativa privada e para servidores públicos. Algumas dessas regras valerão por até 14 anos. Para conferir todas as regras clique aqui.
Manutenção das regras atuais
Aposentadoria rural – Pelo texto, a idade mínima fica mantida em 55 anos para mulheres e 60 para homens. O tempo mínimo de contribuição também fica em 15 anos para mulheres e para homens. A proposta atinge, além de trabalhadores rurais, pessoas que exercem atividade economia familiar, incluindo garimpeiro e pescador artesanal.
Benefício de Prestação Continuada (BPC) – O texto permite que pessoas com deficiência e idosos em situação de pobreza continuem a receber um salário mínimo a partir dos 65 anos.
Abono salarial – O pagamento do abono salarial segue sendo pago a trabalhadores com renda de até dois salários mínimos (R$ 1.996). A proposta do governo de limitar o abono a quem ganha até R$ 1.364,43 foi derrubada por meio de um destaque durante a votação do primeiro turno da PEC 6 no plenário do Senado.
Fonte: PT no Senado